O homem costantemente é lançado de volta para si mesmo

O importnte é compreender, escrever é uma questão de buscar essa compreensão.

quinta-feira, 23 de dezembro de 2010

Praça da Piedade



Estou sentada em um banco na Praça da Piedade, é fim de ano, as pessoas passam com suas sacolas cheias de presentes, com pressa. E eu, ali... vendo as crianças da Piedade que pedem dinheiro na sinaleira. Seus pais, tios, parentes de longe observam os meninos. São crianças de todas as idades que entre o verde e o vermelho brincam.
Na praça tem o menor que engatinhar de um lado a outro, com um pedaço de pão que eventualmente ele leva a boca comendo um pedaço misturado as fezes dos pombos. Do seu nariz, escorre um grosso catarro verde. A mãe observa de longe Matias, sentada no chão. De quando em vez um transeunte desavisado quase passa por cima de Matias, outro o olha com desprezo.
Matias é uma das crianças mais lindas que já vi, ele é livre, dono daquele espaço.
Ele chega perto de mim, ele me toca com sua mãozinha, ele me olha e sabe que eu o observo. Desconcerto-me, o menino me causa ... medo, nojo, impotência. Seu olhar me rende e já o tenho nos braços. Seus irmãos se aproximam me convidam a brincar, me mostram uma nova forma de ver o mundo. Abandono minhas malas e aceito o convite.
Por instantes esqueci que era um observador no banquinho da praça, agora comungava uma experiência.
O pai chama os meninos para tomar banho, volto ao banquinho e os vejo na fonte. A mesma água que eles bebem, cozinham, se banham, é a água que um dos meninos está mijando, mas isso só é estranho para mim que estou no banquinho. O banho se completa com uma roupa limpa e uma água de cheiro. São 17hs e os meninos precisam ir para casa.
E fico de longe com esse olhar pequeno-burguês.

domingo, 25 de julho de 2010

Frida Kahlo








"Quando o olho gira para dentro. E poucos são os olhos que conseguem fazer isso, a paisagem vista pode não ser a mais bela. Contudo, é o que se tem."
(Trecho do livro O Ensaio Sobre a Cegueira)

sábado, 17 de julho de 2010

Conversas sobre cultura (Manutenção de grupos) – Xisto Bahia


Hoje tivemos um dia de intenso debate e provocações. Grupos de teatro e dança da cidade compuseram três mesas, onde foram abordados temas como: gestão de grupo, editais de manutenção e apoio para grupos, desejos artísticos, meios de sustentabilidade, retorno financeiro, conexão e interatividade com outros grupos, dentre outros. Diante de temas como esses, me sinto inquieta, com o desejo de entender esse universo tão vasto.
Tantos grupos, um desejo em comum: voltar o olhar para si.
O Dimenti diz que era preciso criar alternativas para que o grupo não morresse buscando interagir, conectar-se com outros grupos e novas linguagens. O Bando nasce com o desejo artístico de se expressar, buscar redes de interação com grupos, mesmo após 20 anos o grupo enfrenta as mesmas dificuldades em manter-se. O Tran-Chan há trinta anos vive de editais, com a linguagem da dança busca difundir um pensamento estético-poético-político. A Sua Cia de Dança, com muita sinceridade busca entender sua importância e valor artístico. Os Novos Novos com crianças nos emociona para falar do universo desses através da arte, com um trabalho iluminador propositor de uma juventude consciente, questionadora. O Vilavox com toda sua força política, irreverência e alma, se desnuda para falar da busca por autonomia. A Outra Cia de teatro com a coragem e força para viver dos seus feitos. E João Perene Núcleo de Investigação Coreográfica busca propor uma reflexão sobre a identidade do grupo. Na platéia, artistas que como eles fazem arte “pelo inferno e céu de todo dia”.
O que os grupos querem é preservar sua historia e repertório, se capacitar em áreas convergentes ( edição de vídeo e áudio, iluminação, gestão de grupo, dentre outros), ampliar sua atuação no mercado, ser assistido pelo maior numero de pessoas nos mais variados espaços. Busca-se construir um pensar artístico através de pesquisas que resultam numa criação artística. A busca pelo público é algo recorrente, ir ao seu encontro, sair da caixa cênica, ir para a rua, usar espaços não convencionais.
A principal questão abordada talvez tenha sido a necessidade de sustentabilidade pessoal, através da arte, fugir do segundo emprego “viabilizador” do fazer artístico.
Fica claro em encontros como esse a necessidade do dialogo entre a classe artística, a carência de nós, a falta de conhecimento e troca entre grupos com inquietudes muito próximas. Alem disso a falta de debate e articulação política para propor melhoras as autoridades públicas. Não sabemos como funciona a secretaria de cultura, a quem pedir “socorro” para manter nosso fazer teatral. Sozinha a secretaria de cultura não tem como abrigar nem virar mãe dos grupos. Mas leis antigas podem e devem ser rediscutidas para que sejam melhor executadas, e novas leis podem ser criadas visando atender as atuais necessidades. A gente precisa propor um diálogo efetivo com a secretaria do estado, como fez o Movimento Arte Contra a Barbárie, criado em São Paulo no final dos anos 1990, onde artistas e grupos de teatro, além de intelectuais, questionavam o modelo de financiamento da cultura baseado exclusivamente no incentivo fiscal e a falta de diálogo entre o poder público e a sociedade. E hoje, na nossa cidade, o que devemos questionar?
Em outros encontros tem se falado muito do momento atual como um momento de crise nas produções artísticas, jogando a “culpa” na falta de dinheiro para produzir bons espetáculos. Mas será que o problema está só na falta de dinheiro? Ou tímidas propostas têm sido feitas? Se tivéssemos todo o dinheiro do mundo, será que bons espetáculos seriam feitos, com propostas inovadoras, provocantes? No manifesto publicado pelo movimento Arte Contra a Barbárie eles dizem: “A aparente quantidade de eventos faz supor uma efervescência, mas, na verdade, disfarça a miséria dos investimentos culturais de longo prazo que visem à qualidade da produção artística”.
O dinheiro destinado a cultura no estado da Bahia não chega nem perto do ideal, seu percentual é inferior ao da maioria dos estados Brasileiros, que já é pouco, se comparado ao de países considerados desenvolvidos. Não temos mercado de trabalho. Tenho tanto medo quanto meus colegas da escolha que fiz, mas agora é tarde, estou inflada demais para desistir, envolvida e com todas as culpas para me culpar de qualquer coisa, apaixonada demais para acreditar que o dinheiro possa ser o maior impeditivo de novas ações artísticas.
Quero parabenizar todos os artistas que com coragem perseveram e criam, mesmo quando tudo parece estar perdido. Que esses que fazem sejam exemplo para os que esperam tempos melhores, pois são os construtores do novo tempo. Que novas leis sejam propostas e debatidas para que tenhamos melhores condições de trabalho, vamos criar e discutir formas de sustentabilidade. Puxemos um pouco a responsabilidade, pela atual realidade dos artistas baianos, para nós, pois é a única forma de reagir, se articulando politicamente, buscando sempre entender como as coisas funcionam.